quinta-feira, julho 12, 2007

Jair Barth

Alguns dias depois da morte do Professor Jair em 1973, aos 68 anos de idade e ainda sob o impacto da perda pesando sobre minha sogra e seus filhos, procurei na estante de sua casa o livro Discursos de Jair Barth, no intuito de conhecê-lo melhor. Ele era o orador oficial da cidade.

Lembro-me de ter ficado surpresa com sua erudição, suas imagens de palavras e sua extrema delicadeza de expressão. Só então percebi o vazio que ele deixou em Itapetininga e só então entendi a longa fila de carros acompanhando o féretro, os amigos chorando abertamente e os discursos emocionados dos seus admiradores à beira do túmulo aberto. Parecia que não estavam se conformando e que retardavam propositalmente o enterro. A homenagem prestada ali foi inesquecível.

Era um homem retraído e tímido, que ficava facilmente corado e não encarava as pessoas de frente, meio à inglesa. Parecia que não se interessava pelas pessoas, mas isso não era verdade. Era tímido mesmo. Intelectual e introvertido.

Professor de Línguas Portuguesa e Espanhola, na primeira metade do século passado importava da França, da Argentina e de outros países os livros que não encontrava no Brasil.

Seu pai, João Barth, tinha uma farmácia e fez com que o filho Jair se formasse farmacêutico, talvez para tomar conta dela. Mas parece que não era a escolha certa para Jair. Não sei como foi, mas ele abriu uma loja de armarinhos, que D. Zélia dirigia. Ele não tinha o espírito do comerciante, daquele homem que gosta de vendas. Acho que se completavam.

Podia-se ver que o que ele gostava era de ler seus livros e de escrever seus discursos. Imaginem um orador oficial introvertido. Parece que não combina, não é verdade? E o pior é que não combinava mesmo. Ele sofria antes de cada discurso e D. Zélia dizia que ele tinha crises de fígado e enxaqueca e passava muito mal.

Ela pedia a ele que parasse com os discursos, mas ele era solicitado por pessoas eminentes da cidade e tinha aquele pudor antiquado de dizer não.

Parei aqui para mostrar ao Nelson. Sinto o peso da responsabilidade em escrever sobre o pai dele. Só tive com meu sogro um curto relacionamento de sete anos, nora-jovem-trabalhadora-professora-mãe-de-dois-filhos-dona-de-casa, com aquele homem famoso, culto, erudito, distante (impressão que dava), que lia na grande parte do tempo, escrevia e dava aulas em outra grande parte e ainda passava algumas horas por semana na loja. Nessas horas ele costumava fazer um rictus com os cantos da boca, como quem está contrafeito, senão contrariado. Não o conheci direito e sinto pena disso até hoje. Depois que ele ler, continuarei com outras lembranças, que não são minhas.

5 Comments:

At 13/7/07 9:48 PM, Anonymous Anônimo said...

De repente fui tomado de einexplicável pudor: será que eu tenho direito de estar privando de tantas revelações familiares. É bem verdade que se trata de revelações elogiosas... Então deixemos de lado as cerimônias e vamos aproveitar para conviver com tão maravilhosos exemplos. Admiro muito o respeito que vc tinha com os pais do Dr. Nelson e tem tbm com ele próprio, até ao ponto de pedir um parecer para continuar falando bem do Sr. Jair.

 
At 14/7/07 10:16 AM, Blogger Antônio said...

Santa Nice

O mais interessante em todos os seus escritos é que você só cita as qualidades das pessoas. E olha que elas não precisam estar mortas para serem beatificadas. Seus olhos só enxergam o lado bom das pessoas ou os antecedentes biografados eram pessoas puras e sem defeitos?

 
At 16/7/07 1:58 PM, Blogger marianicebarth said...

Meu querido Shiost. Como você é observador! Eu admiro você cada vez mais! Você é fantástico!
É evidente que as pessoas que retrato aqui só mostram seu melhor... Também é verdade que prefiro vê-las por esse lado. Mas todas são humanas, portanto têm seus defeitos, problemas, ou mesmo falhas de caráter. Só que elas também têm seu lado bom. Então eu gosto delas. E ainda por cima não acho que um blog público seja lugar para se colocar o "outro lado" das pessoas, que eu enxergo muito bem...
Mas no meu livro sobre essas pessoas, poderei, certamente.

 
At 16/7/07 2:10 PM, Blogger marianicebarth said...

Timtim, você tem todo o direito. Eu já não o promovi a "mais que amigo", digno de toda a confiança? Afinal, nem estou entendendo. Você é tão fechado assim sobre sua própria família?
E Shiost, continuando o seu assunto: essas referências elogiosas aos familiares são a mais estrita verdade, mas leia a resposta ao comentário do Shiost. Ninguém é perfeito, nem eu, nem o Shiost, nem a minha queridíssima Vovó Tina ou quem quer que seja. O que o Shiost não entendeu ainda é que uma pessoa pode ter (E TEM) os dois lados da mesma moeda e que nem por isso nós deixamos de gostar dela COMO ELA É! E que os dois lados é que fazem o tempêro de uma pessoa. Mas também, não é gentil colocar o outro lado. Ou sim? Quer que eu conte tudo, absolutamente tudo? Aqui mesmo?
Olha... É perigoso...

 
At 23/7/07 7:34 PM, Anonymous Anônimo said...

Prima Nice
Interessante!
Parece telepatia, mas no comentário que fiz no blog do Shiost sobre o A.C.M. falei mais ou menos o que vc. disse aqui; sobre os lados da moeda que todos temos.

 

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