sábado, janeiro 12, 2008

O SONHO - Capítulo VI

... girei as duas chaves ao mesmo tempo.


Imagens brotavam pelo topo do entalhe e se projetavam por toda parte, em todas as paredes, ora nesta, ora naquela, uma depois da outra em rápida sucessão, ou em todas ao mesmo tempo, imagens fugazes que me encantaram mas não se fixaram na memória, quadros todos de figuras femininas, vestidas nos mais diversos estilos de épocas passadas... Apenas dois ficaram bastante tempo e apenas desses dois guardo até hoje a lembrança.
O primeiro era um quadro muito grande, em que duas camponesas usando toucas brancas sentadas frente a frente, olhos nos olhos, refletiam-se como num espelho. A da esquerda era muito jovem e parecia ansiosa. A outra, de meia idade parecia serena e tranquila. As feições eram semelhantes, como mãe e filha. As duas usavam blusas brancas de mangas bufantes, saias cinzentas, aventais brancos e tamancos holandeses. Estavam na mesma posição, uma olhando para a outra, as mãos descansando sobre os joelhos. Formavam uma dupla muito bonita. Embora usassem toucas, eu "sabia" que tinham cabelos escuros.
Esse quadro também se esfumou e em seguida apareceu apenas uma figura, em uma única parede: uma Alice em diagonal (aquela mesmo de Lewis Carol), a do País das Maravilhas, mas era comprida como se tivesse sido esticada, vestida de amarelo, de cabelos louros, com expressão de susto. (No desenho está com expressão de terror, para dar mais drama à cena). E estava na parede da luz... E ela foi se esticando, esticando...
E aí acordei. Mas o sonho não se esfumou. Pelo contrário. Contei ao Nelson, que gostou bastante. Nessa manhã fui à aula do Helenos, que me recebeu perguntando se eu tinha desenhos novos. Respondi que não, mas antes que ele pudesse me olhar daquele jeito sarcástico que me magoava, fui logo contando que tivera um sonho.
― Sonho?! Sonho é muito bom!! Conta seu sonho!!
Contei inteirinho e ele ficou todo animado.
Finalmente você começou a trabalhar sua cabeça! Desenhe essa porta!
E assim saiu um dos desenhos que mais gosto, mas no original, nesse dia, meu lado esquerdo do cérebro imperando, coloquei maçaneta e dobradiças, que não constavam da porta do sonho. Mesmo assim, Helenos gostou. Ele também não percebeu todas as mensagens que estavam tão óbvias.
No desenho que publiquei, tirei esses apetrechos inúteis e que estragam completamente a mensagem principal do sonho mais espetacular que já tive em toda a minha vida.
Tenho uma amiga-gênio, chamada Telma, que é psicóloga e um amigo do Nelson que é psiquiatra. Os dois explicaram a mesma coisa em épocas diferentes:
1 - Eu estava na penumbra (não conseguia ver direito e por isso não conseguia desenhar nada que prestasse). E a luz (a inspiração) estava separada de mim por uma porta.
2 - Num banheiro (o meu estado mais íntimo) com pessoas me observando como se estivessem numa frisa de teatro, em que a "artista" era eu e me sentia constrangida como se elas estivessem me espionando desavergonhadamente.
3 - A babá estava com a Christina no colo, ali dentro comigo (eu estava realmente muito ligada às crianças, o que era natural, mulher parideira que era).
4 - Girando a chave da esquerda ( lado esquerdo do cérebro) apareceram quatro mamadeiras (óbvio) e como isso ia se tornando uma armadilha, desvirei e as mamadeiras voltaram (mas não antes que eu pudesse apanhar a última e dá-la à Chris-bebê... (totalmente mulher parideira, com muita honra!).
5 - Girando a chave da direita, apareceram figuras de Disney, nada original e não era isso que eu desejava. Desvirei e fiquei pensando embatucada que não havia jeito de sair para fora daquele banheiro escuro (ou entrar para a luz que brilhava fora).
6 - Não conseguia perceber o óbvio: a porta não tinha maçaneta nem dobradiças porque estava solta. Eu só precisava dar um empurrãozinho e ela cairia e eu poderia passar!
Isso significava que eu estava "quase" pronta para começar a "soltar a franga"! Se não tivesse medo de errar, teria passado...
Medos, medos, medos, são as coisas que atrapalham os artistas! Picasso não tinha medo, nem Pollock, nem Miró, nem Dali, nem outros que se destacaram da multidão. Mas eu não acreditava em mim mesma, não reconhecia nenhum talento próprio...
Eu tinha medo de me expor, de expor meu trabalho à critica, à malhação, ao desprezo ou até à condenação. Talvez eu tivesse medo de ser considerada medíocre ou pior... Um nada...
Mas o pior mesmo é que continuei cega por mais algum tempo. Mesmo sentindo que alguma porta se abrira "dentro da minha alma" e que, de repente, comecei a produzir desenhos cada vez mais interessantes!

8 Comments:

At 16/1/08 10:11 AM, Anonymous Anônimo said...

Pra mim, que sou um tanto descrente com relação ao valor dos sonhos, fica o valor da narrativa. Uma verdadeira pintura feita com palavras bem escolhidas. O que importa é que você acabou desabrochando e está aí a artista e escritora. Fala mais do Helenos.(Que fim levou, continuam amigos, continuam as aulas?)
Será que a nossa comunidade blogueira se desarticulou?! Onde estão Shiost, Caos, Primacaçula, Turini, Lucy et alii.?

 
At 16/1/08 11:24 AM, Blogger marianicebarth said...

Timtim, você sabe que os sonhos têm mais de uma explicação. Uma delas será a que você aceitará, penso: nossa mente fabrica soluções, quando não as conseguimos encontrar no nível consciente. Então temos sonhos com mensagens cifradas, hieroglifadas, ou simplesmente "imaginadas"
(imagens que nos levam a pensar, a discutir interiormente ou com outros para entender o significado).
Esse sonho foi tudo isso. Sofri (porque eu sofro quando não consigo fazer alguma coisa) durante NOVE meses. O Helenos disse que foi um verdadeiro parto, mais um da "mulher parideira" que era. Mas quando me contaram o significado, tudo ficou claro como cristal.

 
At 16/1/08 2:23 PM, Blogger Polemikos said...

TimTimDez. Você que quase foi padre, não acredita no valor dos sonhos!?. A Bíblia inteira, e os Evangelhos tambem, estão repletos de sonhos .... É quando o Céu se manifesta, manda mensagens, revela segredos, desvenda o futuro, etc ...

 
At 16/1/08 8:48 PM, Blogger marianicebarth said...

Polemikos, o Timtim não foi "quase padre", ele é padre até hoje.

 
At 17/1/08 5:09 PM, Anonymous Anônimo said...

Mas, como estão vendo, um padre meio "incréu". Polemikos tem razão, embora eu diga que não dou valor aos sonhos, sei que eles existem e devem ter significado sim. Talvez eu relute em aceitar as mais diversas interpretações, que eu considero "chutes", mas quando servem para a gente "dar à luz" nossas soluções...
Valeu a volta do Turini.

 
At 17/1/08 5:39 PM, Anonymous Anônimo said...

Oi, Timtim, olha eu aqui! Me chamou?
Concordo totalmente com o nosso amigo Polemikos e acredito que os sonhos são mensagens não a alguns escolhidos como os personagens bíblicos mas a todos nós, SUAS criaturas!!!
Além disso, acrescento que nós definimos os Sonhos como estados de "emancipação da alma", o mesmo ocorrendo com o Sonambulismo, a Dupla Vista e o Êxtase(João no Apocalipse), ressaltando que os últimos são em estado de vigília.

 
At 17/1/08 7:35 PM, Blogger marianicebarth said...

Você pode não crer lá essas coisas em sonhos, mas disse tudo quando disse que esse sonho "serviu para dar à luz" minhas soluções.
É pena que Young não está mais por aqui...

 
At 17/1/08 9:55 PM, Blogger marianicebarth said...

Priminhacaçula
Adorei essa definição de sonhos: emancipação da alma! É exatamente o que sinto em relação a esse sonho incrível que tive.
Timtim, tenha paciência comigo... Acredito que você vai diretinho para o céu.
Emancipação da alma! Que glória! Finalmente minha alma se emancipou quando a mulher em mim deixou de ser parideira...

 

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