terça-feira, fevereiro 19, 2008

Mudando de Dono

Nada é "nosso" nesta Terra.



Apenas conquistamos, por mais ou menos tempo, o direito de usar. Quando compramos uma casa e moramos nela, defendendo o território com unhas e dentes, temos a ilusão de que é "nossa", mas temos de pagar os impostos, a água e a energia elétrica que utilizamos, o gás etc.. Depois, deixamos em herança para os filhos que também pensarão que é "deles"...


Assim também quando compramos roupas, ou jóias, carro ou o que for. Mas, se um ladrão nos assaltar, "nossas" coisas mudam de dono... Se nos matar, tudo o que supúnhamos que tínhamos, ficará para outros. No Brasil, pensamos em malfeitores ou enchentes, mas em outros países, as catástrofes são incêndios, tsunamis, tornados, vulcões, tempestades.

Acho que por isso é que os hindus chamam esta vida de Maya, ilusão...


Descobri isso há vinte e tantos anos quando fui buscar meu filho adolescente que estava no apartamento de um amigo. Resolvi esperar dentro do carro. Era uma tarde quente e o sol de verão batia forte na rua linda e sossegada, próxima à Ponte Cidade Jardim, destacando as linhas elegantes do prédio, as altas grades de ferro ladeando o portão monumental, tudo muito classudo.


Lembro-me de ter ficado ali admirando o bom gosto arquitetônico do conjunto. O jardim era espetacular, patrulhado por dois seguranças de preto. Eu poderia ter entrado, fui convidada, mas preferi ficar ali em frente, olhando para o prédio sem defeito. Pensei estar segura, pois os dois musculosos de preto estavam andando de um lado para o outro logo atrás das grades. Na verdade, nem me ocorreu nada negativo.


Meu carro não tinha ar condicionado e as janelas estavam abertas. Meu filho custou para descer, mas eu não estava entediada, apenas distraída com a beleza toda. Foi quando senti por fração de segundo algo quente e macio no pescoço e a linda corrente de ouro com pingente que o Nelson me dera no último Dia da Mães foi puxada e levada. Simples assim. Nem entendi como. Saí do carro e vi lá longe o ladrão correndo à toda. Sumiu na virada da esquina antes que os dois seguranças pudessem sequer abrir o lento portão eletrônico. Era tarde. Minha joinha se fora... Já não me pertencia... Ainda fiquei matutando que os dedos do ladrão não me machucaram em absoluto. Ele provavelmente roía as unhas até o sabugo.


Voltando para casa, filosofei com meu filho sobre os destinos que "minha" jóia tomaria daí em diante. Agora é do ladrão, daqui a algumas horas será de quem comprar dele e depois... sabe-se lá... Engraçado, filho, pensei que fosse "minha", gostava tanto dela, presente do seu pai... Mas na verdade, apenas ganhei o direito de usá-la por uns tempos... Como todas as coisas materiais...


DONO:
do Lat. domnu por dominu, senhor
s. m., senhor de alguma coisa,

proprietário,

possuidor.

14 Comments:

At 19/2/08 9:32 PM, Anonymous Anônimo said...

"Não ajunteis tesouros da terra, mas os do céu, onde os ladrões não roubam e a traça não corrói". (É mais ou menos isso!)

 
At 19/2/08 10:29 PM, Blogger marianicebarth said...

É exatamente isso. Mas confesso que é gostoso e gratificante poder pelo menos pagar nossas contas direitinho e para isso, precisamos ganhar um dinheirinho... E também é muito bom viajar para ver nossas filhas e todo mundo acho que concorda com isso. E que a gente se apega às coisas, também é verdade, mas se pensarmos que todas as coisas são cedidas ou emprestadas e apenas por tempo limitado e que mais cedo ou mais tarde voltará para o cosmos, fica mais fácil...

 
At 20/2/08 11:59 AM, Blogger Polemikos said...

O "meu" corpo é tão "meu" quanto um dia foi a "sua" correntinha.

Dá calafrios pensar assim, mas fazer o que? As coisas são assim!

O corpo é algo de materia grosseira, por assim dizer e então, a gente aceita um pouco coisa. Mas dizem os entendidos que a "minha" mente, meu pensar, no fundo, segue a mesma essência. E até "meu" sentir é tão efêmero quanto.

Então, o que sobra? O que sou EU?

Se não é meu corpo, não é minha mente, não é meu sentimento, nem minha consciência, então onde está e o que constitui o meu EU?

 
At 20/2/08 4:17 PM, Blogger marianicebarth said...

Pois é isso. O "seu" corpo e tudo o mais que você pensa que constituem o EU, são apenas acessórios que possibilitam que você possa usufruir de todo tipo de experiências sensoriais, emocionais, físicas, mentais etc.. Mas o "seu Verdadeiro EU" prescinde disso tudo, pois LÁ, no Âmago de Deus, de onde saímos e para onde voltaremos, não precisamos de nada disso, penso.

 
At 21/2/08 10:34 PM, Anonymous Anônimo said...

VIVA! Nosso grupo é mesmo riquíssimo.
Será que este texto é também da fase produtiva, introspectiva, do ano passado? Fico orgulhoso de pertencer ao grupo de comentaristas tão profundos. O meu EU é o meu querer, o meu pensar e o meu agir, mas muito influenciado pelas forças externas, o que significa dizer que somos donos de muito pouca coisa. Mas é por este pouco que eu sou responsável; e é esta responsabilidade que me faz sentir que eu existo, eu sou EU: quero, sinto e ajo diferentemente de todos .Timtim

 
At 21/2/08 11:37 PM, Blogger marianicebarth said...

Não, Timtim, este texto foi "saindo" na hora em que postei. Comecei postando aqui o Ladrãozinho, depois A Passagem e, finalmente me animei e "saiu" este, mais ou menos sobre o mesmo tema, de que não podemos ter certeza da posse de coisa alguma.
O verbo "possuir" é a maior ilusão.

 
At 22/2/08 2:53 PM, Anonymous Anônimo said...

É exatamente isso; Jesus não quis dizer para vivermos sem nada, doarmos tudo que temos, não pensar no dia de amanhã! " AJUDA-TE E O CÉU TE AJUDARÁ", são palavaras dele.
Como estamos distantes de poder compreendê-lo! Como querer então, um mundo melhor!?

Dá para dizer, Polemikos que são esses entendidos? Pertencem à que corrente filosófica?
Segundo sei mente, sentimentos, emoção... são o nosso Eu maior!

SER OU TER... eis a questão!

 
At 22/2/08 2:54 PM, Anonymous Anônimo said...

CADÊ O SHIOST QUE NÂO COMENTA MAIS NESTE BLOG???

 
At 22/2/08 9:30 PM, Blogger Antônio said...

Shiost rides again!

Tenho uma solução para todos vocês. Os adeptos da Igreja Universal costumam pregar em seus carros a seguinte faixa: "Propriedade do Senhor Jesus Cristo". Já que nada pertence a vocês, o Bispo Edir Macedo os espera de braços abertos (+11%).

 
At 22/2/08 9:31 PM, Blogger marianicebarth said...

Já estive lá pelo Refulgir e deixei um apelo.

 
At 22/2/08 9:32 PM, Blogger Antônio said...

Desculpe, Nice, mas estou num desfiladeiro inconseqüente e profícuo que só a adstringência de Solomeu poderá resolver.

 
At 23/2/08 11:27 PM, Anonymous Anônimo said...

Pena que eu não quero "cair nos braços" do Edir Macedo!

 
At 25/2/08 6:39 PM, Blogger Polemikos said...

Amiga_Caçula : esses entendidos não são necessariamente esoteristas. Tem um psicólogo Roberto Assogioli (da Psicossintese)que tem leituras muito interessantes sobre o assunto do Eu Superior. Carl Jung (psicanalista) tambem defende estas posturas. Algumas correntes como a Antroposofia adotam tambem a filosofia que mente, sentimento, etc .. são "apenas" veículos do Eu_Superior.

 
At 26/2/08 9:28 PM, Anonymous Anônimo said...

E viva a diferença de conceitos e opiniões, não é mesmo?
"O meu sentir é tão efêmero quanto à matéria grosseira???

Acho melhor acreditar que o meu sentir e pensar fazem parte integrante do meu Eu superior e que não são efêmeros, apenas passíveis de modifiação no sentido evolutivo do Ser.

 

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