sábado, outubro 06, 2007

Uma Grande Paixão X

Mariana com uns dois anos e meio e José Marcos, outro priminho
Daí em diante, tudo foi mais tranqüilo.
Anna passava para me ver e visitar os tios e primas muitas vezes, sempre que podia. "Ela" de alguma maneira me fascinava, mas me dava uma sensação de perigo quando chegava. Eu percebia também que Mamãe, Papai e todos que estivessem na casa sentiam a mesma coisa. É óbvia a explicação: "ela" poderia me arrancar de lá a qualquer momento. Mamãe vivia com medo de que isso acontecesse.
Então, desde essa idade de um ano e três meses, eu ouvia a minha história e portanto cresci sabendo que aquela querida protetora a quem eu chamaria de Mamãe pelo resto da minha vida, não o era na verdade. Isso era tão perturbador que me trazia pesadelos em que eu a perdia, de uma maneira ou de outra. E sempre acordava gritando. Quando cresci mais um pouquinho, já não gritava, mas, apavorada pelo medo da perda dessa mãe por escolha, colocava minha mão em seu nariz, para sentir sua respiração. Procurava sua mão entre as cobertas de sua cama e segurava-a até poder dormir novamente.Eu não aceitava a idéia de que Anna era a "mãe verdadeira". Não via nela nenhuma semelhança comigo, não sentia nela nada que pudesse me atrair, a não ser as histórias que contava.
Anna tinha realmente muito jeito para isso. Chegava sempre sem aviso e logo havia uma mesa posta para ela. Imediatamente se formava uma platéia à sua volta e logo todos nós ficávamos presos ao enredo. (Talvez eu tenha herdado um pouco disso). Eu gostava particularmente das histórias que "ela" contava de seu pai, meu avô. Dizia coisas dele que fariam qualquer pai feliz. Tenho dele a impressão de que foi um homem culto e de poucas palavras. Professor, enérgico e mandão e não havia quem o desobedecesse, inclusive "ela". Papai Pedro, que era o irmão caçula tinha por ele o maior respeito e admiração.

Entre outras histórias, Anna contou que tinha cinco anos quando seu pai quis ensiná-la a nadar no rio Ribeira, que é respeitável. Deu a ela as instruções todas de movimentos de braços e pernas e como fazer para respirar.
Ela olhou para o rio caudaloso e rápido e teve medo. Sua hesitação o irritou. Ele lhe ordenou que entrasse na água, que "filho dele nenhum podia ter medo" e acrescentando que confiasse em seu pai, pegou-a e atirou-a no rio. Ela afundou várias vezes, mas lembrando-se da orientação e, principalmente da confiança de que ele a salvaria se preciso fosse, acalmou-se e saiu nadando como pôde, carregada pelo rio... e ao chegar à margem uns cinqüenta metros de onde caíra, já lá estava ele, todo orgulhoso.
Não sei muito bem o que pensar desse fato... Como seria ter sido sua neta? Provavelmente teria tido um pouco de medo desse homem déspota... ou ao contrário... tudo teria feito para conseguir o amor dele... como Anna?... Outra pergunta jamais respondida.
Mas Papai, que era espírita, sempre dizia à Anna que "a Mariana é a reencarnação do Tonico! Essa menina é a única que me enfrenta... Não tem medo de mim... e sai sempre ganhando"...

Papai era outro de meus amores. Quando eu tinha dois anos, lembro-me de estar saindo pelo portão da rua de baixo, com um litro vazio de leite na mão e na outra uma moeda de 200 réis, para ir "comprar leite para o papai", sem que ninguém tivesse percebido. Só que me perdi. Atravessei uma, duas, três ruas e acabei não sei como sendo recolhida por uma senhora velhinha, D. Etelvina, que me levou para sua casa, perto do Quartel.

Deixei todo mundo em polvorosa. Papai foi para um lado, Santa para o outro e Pique para o outro. Esta era a filha mais nova e mais doce de mamãe e papai, com 18 anos na época. Estava namorando um tenente do Exército, com quem acabou se casando. Esse oficial, a cavalo, também ajudou a procurar e perguntando de casa em casa acabou me encontrando...

Não me lembro de ter levado bronca de ninguém nesse dia. Acho que todos ficaram felizes por eu estar sã e salva. Mas o papai ficou sem o leite...

6 Comments:

At 7/10/07 8:34 PM, Anonymous Anônimo said...

Achei muito interessante o que disse sobre as histórias que sua mãe contava ...
Interessante! Fui católica, depois agnóstica para não dizer atéia, e acabei seguindo uma parte da família da mamãe que era espírita, inclusive o vovô Jango de quem tinha tanto medo por influência da mamãe!

 
At 7/10/07 10:08 PM, Anonymous Anônimo said...

Até para quem não tem nenhuma ligação com a família está interessante seguir as aventuras da pequena Nice. Imagino que deve provocar bem mais suspense nos familiares, como a "primacaçula", o Deto, a Chris.
é repetitivo dizer, mas o seu estilo prende do começo ao fim.

 
At 7/10/07 10:37 PM, Blogger marianicebarth said...

Timtim, é repetitivo agradecer a você, mas o faço novamente. Quando vai ser o encontro com os blogueiros da nossa praça?

 
At 9/10/07 11:56 AM, Anonymous Anônimo said...

Cada capitulo eh uma surpresa. Crescemos sabendo das historias, sempre do ponto de vista de minha vo tina como a chamavamos. Minha mae nunca gostou de dizer como se sentia em relacao a "ELA". Ao menos nao os verdadeiros sentimentos que aqui acompanhamos como a novela das oito!
Filha
Chris

 
At 10/10/07 10:35 PM, Anonymous Anônimo said...

Pelo que nós da família sabemos ou pensamos, sua mãe sempre amou muito a vovó Juventina*( para nós, seus netos).

 
At 11/10/07 7:31 PM, Anonymous Anônimo said...

Ah, esse é o Tadeu, o priminho que colocava frango vivo no fogão à lenha da vovó?

 

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