domingo, julho 20, 2008

Um mês e meio...

O Namoro

Durante os primeiros meses o João, que apenas conversava com as três amigas, começou a me telefonar, mas se a Santa (vinte anos mais velha do que eu) atendia, falava com ela longamente, trocando idéias e até receitas. Depois falava comigo e recitava poesias românticas, cantava músicas ou tocava discos que me fazia ouvir.
Ele era além de tudo, um filho exemplar e um irmão dedicado. Sua irmã, nascida dois anos antes dele era deficiente mental e sofria de epilepsia num grau altíssimo. A moça já perdera muitos dentes com as quedas e convulsões, estava cheia de cicatrizes por todo o rosto e pelo corpo e só o pai ou o João conseguiam segurá-la e protegê-la, para impedir que se machucasse ainda mais. Era muito triste sua aparência, coitadinha.
O João ajudava bastante sua mãe, que não podia sair nunca por causa da filha. Ambos cuidavam da mocinha, na ausência do pai. O João adorava a irmã e sentia por ela uma pena infinita, jamais se queixando do trabalho que ela dava. Uma tarde me levou até sua casa para me apresentar aos pais e irmãos. Abraçou e beijou a mais velha com o maior carinho, ao me apresentar. Além dos dois, havia mais três filhos, dois ainda pequenos. Por isso o João sabia cozinhar, fazer doces e bolos e o fazia muito bem.
A Santa também gostava de cozinhar e trocar receitas. Uma noite o João trouxe um bolo que ele mesmo havia feito especialmente para ela. Dois dias depois a Santa devolveu o prato com um pudim de leite condensado, sua especialidade. O João levou o pudim para casa e contou que todos elogiaram muito. Daí em diante nos telefonemas para falar comigo, metade do tempo ficava falando com ela, eu do lado esperando meio ansiosa, mas gostando de ver que a Santa gostava cada vez mais dele. Mamãe também ficava por ali ouvindo tudo.
Graças a isso mamãe foi conhecendo o João e percebendo que ele era um bom menino. Abrandou-se e acabou consentindo num namoro vigiado. Mas papai realmente nunca soube...
E nesse mês e meio, tive o “namoradinho perfeito” em todo o seu romantismo, aquele príncipe encantado com que sonha toda menina que apenas entrou na adolescência.
Um namoro como uma plantinha frágil, brotada, cuidada e cultivada durante quarenta e cinco dias e... de repente... brutalmente arrancada e destruída!...
Mas as coisas são assim mesmo... Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca se acabe...
Como aconteceu?
Minha mãe biológica, D. Anna, ficou sabendo do namoro e foi à casa do João falar com os pais dele, dizendo que eu era muito novinha para namorar e que ela exigia que se ele quisesse continuar, teria que ficar noivo e já marcar o casamento, imaginem! Ora, o rapaz tinha apenas dezessete anos e estava ainda na sétima série! Seus pais, muito assustados, puseram-no sentado e lhe disseram que ou marcava o casamento, ou terminava o namoro, já que era apenas um namorinho ingênuo, graças a Deus e que ninguém sairia muito ferido...
E o João, também assustado, pois não esperava por essa nem pensava em se casar tão cedo (aliás, eu muito menos!), me deu um fora pelo telefone. Não quis falar comigo, mas só com a Santa. Contou tudo a ela e pediu que ela me transmitisse. Conversaram longamente e eu chorava ao lado, absolutamente inconformada. Foi meu primeiro encontro com a “dor da perda de um amor”, embora esse amor fosse quase infantil.
Durante toda a noite solucei pela brusca interferência de D. Anna. Por que fizera ela isso comigo? E com ele? Qual teria sido o problema?
Mais tarde fiquei sabendo o que houve, mas durante muito tempo não pude perdoá-la pela dor lancinante que causou.
No dia seguinte, pela manhã, fui fazer a prova final de Psicologia e fui muito mal. Foi a primeira e única vez em minha vida que fiquei para segunda época, deixando mamãe doente de tristeza. "Nunca, ninguém nesta casa pegou uma segunda época" — chorava ela — que vergonha! E justo você, em quem deposito tanta confiança! É por isso que eu não queria que você namorasse esse João. Tá vendo no que deu? Uma segunda época!"
Alguns anos depois percebi que nem era bem amor aquilo que senti, mas que doeu, doeu...

16 Comments:

At 22/7/08 10:12 PM, Anonymous Anônimo said...

Sabe, prima?
É muito bom ler o que você escreve, sobre qualquer assunto. Prende a nossa atenção e faz-nos chegar a "ver" as situações do texto!

Quanto a amor ou não pelo João, será que dá para definir esse sentimento tão deturpado?
Porque não... AMOR???

 
At 23/7/08 11:14 AM, Blogger marianicebarth said...

Porque AMOR com letras maiúsculas, para mim, é outra coisa. Naquele tempo eram os hormônios despertando e me abrindo os olhos em direção aos meninos... Um primeiro namoradinho sempre será o primeiro e por isso é inesquecível. Ainda mais quando o rapaz era tão sedutor quanto o João.

 
At 23/7/08 11:14 AM, Blogger marianicebarth said...

Este comentário foi removido pelo autor.

 
At 26/7/08 11:11 PM, Anonymous Anônimo said...

Seriam os hormônios fazendo-a despertar para sensações nunca sentidas ou aquele "sentimento" gostoso que faz com que o mundo páre só para vermos "o nosso amor" passar?
"O tremor nas pernas, o apressar do coração"! Tudo isso é maravilhoso e não volta mais nesta encarnação. Quanto ao AMOR mesmo, será que alguém já o sentiu de verdade? Creio que sim! Por um filho, um neto.... incondicional, sem esperar nada em troca... eterno!

 
At 26/7/08 11:12 PM, Anonymous Anônimo said...

Onde estão aqueles blogueiros de araque? Deram o sinal de partida e agora... "esfumaçaram"!

 
At 27/7/08 12:43 AM, Blogger marianicebarth said...

Acho que não gostam mais de perder seu tempo lendo coisas do passado. E você, o que acha?

 
At 27/7/08 8:55 PM, Anonymous Anônimo said...

Acho que perdem tempo pensando num futuro que ainda não veio ou melhor, que será construído pelo dia de hoje, participando da vida com coragem e confiança.
oarcm

 
At 27/7/08 10:03 PM, Anonymous Anônimo said...

Talvez não gostem de romances de adolescentes ingênuas!
Sabe... acho que não estão querendo nada mesmo! Preocupados demais!
oarcm

 
At 28/7/08 1:46 PM, Blogger marianicebarth said...

Até o Timtim, o Fiel Leitor nos abandonou... Será que está em férias, viajando pelo Brasil?

 
At 30/7/08 11:39 AM, Anonymous Anônimo said...

TÔ aqui, Nice. Viajei de 10 a 23 de julho. Gastei uma semana para retomar o ritmo das coisas. Continuo muito curioso para saber quem é OARCM. Já está muito repetitivo, mas sempre concordo com a primacaçula: seu estilo é envolvente demais. Me revoltei contra a Anna por ter se intrometido no namoro. Mas esta é a sua história. Tudo isto formou esta Nice que o Dr. Nelson ganhou e que é a nossa narradora portentosa e cativante. Timtim

 
At 30/7/08 10:05 PM, Anonymous Anônimo said...

Que bom podermos contar sempre com elogios como esse! Só você, nosso amigo, é capaz de tanta ternura.

 
At 31/7/08 7:10 AM, Blogger Polemikos said...

Timtim. Bom tê-lo de volta. E eu? Você não me visita mais?

Oarcm. Gostei de seus comentários e gostaria tambem de convidá-la/o a me visitar em ggturini.blogspot. com (vulgo Polemikos)

 
At 31/7/08 7:10 AM, Blogger Polemikos said...

Este comentário foi removido pelo autor.

 
At 31/7/08 10:47 AM, Blogger marianicebarth said...

Meu(minha) comentarista misterioso(a. O mistério sempre faz sucesso...

 
At 31/7/08 10:49 AM, Blogger marianicebarth said...

Mas seja benvindo, querido e importantíssimo Timtim! Você não tem idéia da falta que fez! Sem você a gente desanima e pára de escrever. Nunca nos deixe!

 
At 1/8/08 3:28 PM, Anonymous Anônimo said...

É A PURA VERDADE!!! ESTEJA SEMPRE A POSTOS, Timtim.

 

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