quarta-feira, junho 09, 2010

A Formatura da 4ª Série - 1952

Formatura da 4ª Série do Grupo Escolar Adherbal de Paula Ferreira - Turma de 1952 

Todos os vestidos eram cor-de-rosa.
A Odete usava um cinto vermelho para ajustar a cintura e seu vestido de tafetá era enfeitado de estreitas fitas vermelhas de veludo.
Eu era a única que usava tranças, as famigeradas fitas e finíssimas luvas de crochê , confeccionadas pela Edna... Meu vestido era caprichado, de organdi engomado, com babadinhos e rendas. Os sapatos e meias brancos estalando de novos, para a ocasião. 

Na primeira fila, da esquerda para a direita: Odete (em pé). Sentadas: Clara, Neusa, Heloísa, Carmen, Nice, Lourdes, (não me lembro do nome), Sônia e Cecília.

A primeira à esquerda, em pé, é a superforte Odete, que acabou comigo no primeiro e único round, mas não antes de levar a primeira "malada"... 
A suave Heloísa - o pomo da discórdia - é a terceira sentada. 
A japonesinha Clara era a primeira aluna e um doce de menina. Seríssima, não falava. 
Lourdes, que está com o dedo na boca, era a melhor corredora. Chamavam-na de Lourdona... Ela quase voava, de tão rápida. 
Uma vez pedi a ela que corresse comigo me puxando pela mão e ela nem esperou que eu me preparasse. Parecia o Bip bip... Acabei caindo e ela me arrastando, sem nem perceber. Eu não iria largar a mala, então ela foi me arrastando pelos pedriscos da rua sem calçamento, por cima do meu braço que ficou no vivo... Sangrava, ralado e empoeirado, doía pra caramba, até hoje se vê a cicatriz... Ela só parou quando as outras meninas gritaram Lourdes! Lourdes! Pára! Você está "arrastando ela!" 
A mão e o braço ficaram de um jeito que vocês podem imaginar e a dor me arrancava lágrimas, mas o estado do meu uniforme estava pior... Aaai, como vou enfrentar mamãe, mais uma vez?...
 Fui pra casa aguentando a dor, que o medo era maior. Desta vez como ia ser? Encontrei mamãe na cozinha e ela arregalou os olhos. Caiu de novo? Caíííí... já chorando. Ela só sacudiu a cabeça e me pegou pela mão ralada e lá fomos pro banheiro lavar bem com sabonete ... aaaiii e depois o álcool canforado, AAAAAIIIIIII... desta vez uma gaze e um esparadrapo para proteger. 
E não tem que chorar, que é isso, parece moleque se machucando desse jeito! 

Da segunda fila, todas eram mais velhas. Só me lembro da Irene, a segunda da esquerda para a direita. Nossas aulas eram de manhã. E num sábado a Irene convidou toda a classe feminina para ir à casa dela depois do almoço para uma "festa à fantasia", sendo que ela forneceria as roupas, de outros carnavais.
Foi engraçado, porque chegando lá, vimos uma grande caixa de papelão com fantasias até a boca. As meninas correram e cada uma escolheu a sua. Eu, molenga, só fiquei olhando. A Irene falou: Ninguém pode ficar sem fantasia! Marianice! Pode ir escolhendo a sua! Obedeci. Mas chegando junto à caixa vi que só sobrara uma: a do Super Homem, de cetim vermelho e azul, com o irônico S... Sacudi a cabeça para a Irene: Não quero essa! É de homem! E de homem grande, não serve! Não tem outra, disse ela. Vista essa mesmo! Fantasia é fantasia, tanto faz. 
Nunca mais, em toda a minha vida, vestiria outra fantasia. Aquela de Super Homem me bastara. Nem consegui curtir a tal "festa" com aquele uniforme todo largo no meu corpo. Nunca me senti mais magra. E elas apontavam e morriam de rir. Até eu ri de perder o fôlego, porque estava mesmo ridículo e impagável. 
Mas assim que se distraíram com seus guaranás e seus bolos, disfarçadamente tirei aquilo e fui embora, filosofando. Desenvolvera em alguns minutos um senso de ridículo para toda a vida...

É incrível como a visão dessa foto me trouxe de volta aquelas cenas em cores vivas. A fantasia que me sobrou! Justo a de Super Homem! Imagens completamente esquecidas num cantinho qualquer de minha mente.
E como as imagens e as emoções provocadas por elas voltaram vívidas! Sinto a textura do cetim amassado, a vergonha de ter de vestir aquilo e de me expor ao ridículo, sinto o cheiro de coisa guardada, e sinto na pele o calor do sol da tarde entrando pela janela e iluminando a meninada risonha e barulhenta, encantada com tão pouco...

7 Comments:

At 9/6/10 7:24 AM, Blogger Polemikos said...

Nopssa, Nice, esqueceu o nome de uma colega?

 
At 9/6/10 12:18 PM, Anonymous primacaçula said...

Mais uma vez, querida Nice foi alvo de gozação? Talvez isso a tenha marcado também no que se refere a horror de caçoadas, não só a dos meus irmãos.

Polemikos!
Está assustado com a memória da Nice? Ela me disse ontem que é lembrança mesmo e não imaginação.

 
At 9/6/10 4:56 PM, Blogger marianicebarth said...

Rsrsrs... pois é, Turini, você vê só?

 
At 9/6/10 8:04 PM, Anonymous timtim said...

Faço coro ao sarcasmo do Turini: Que absurdo! Esqueceu o nome de uma colega! Menina, eu estou admirando tudo: a foto guardada, a lembrança do nome de cada colega, a descrição de pormenores. RECORDAR É VIVER.

 
At 10/6/10 9:39 AM, Anonymous primacaçula said...

Você sempre, Timtim, tem esse dom: de admirar tudo!
Quando "crescer quero ser como você"!

 
At 10/6/10 12:26 PM, Blogger caos e ordem said...

Impressionante a corredora que saiu arrastando a Nice. Uma pessoa dessas devia ter neurônios faltando.Nem entendi direito a razão de não soltar a mão.

 
At 12/6/10 11:25 PM, Blogger marianicebarth said...

Zeca, ela era mesmo uma menina de índole afetuosa. Se chegou à 4ª série, e o estudo naquele tempo não era precário como hoje, suponho que tivesse inteligência que pode ser considerada normal. Não me lembro desses detalhes, mas realmente a Lourdes era a melhor corredora, talvez apenas um pouco desligada... Será que estou certa?

 

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