Domitila vem para casa
Alegria, Alegria!!!
A moça mora no Ipiranga e foi lá, perto do Palácio do Imperador, que ela ouviu o miado fraquinho. Com o carro equipado com as coisas da gatinha, a caixa de transporte toda forrada com uma almofada e um cobertorzinho de flanela estampado de florzinhas minúsculas, tudo feito por mim, lá fui eu toda feliz e ansiosa. Como ela estará, será que cresceu, será que vai me estranhar, será que... será...?
Deu tempo de ir pensando no nome, que foi mais ou menos óbvio: Palácio do Ipiranga – gatinha siamesa/vira-lata... Poderia ser Leopoldina, como a nossa primeira Imperatriz, se fosse de sangue puro; também poderia ser Domitila (ou Domitília para alguns historiadores), como a amante de D. Pedro I – Maria Domitília de Castro Canto e Mello que, de plebeia que era, foi elevada pelo Imperador à aristocracia como Viscondessa e, mais tarde, Marquesa de Santos.
Prezo muito e respeito Dona Leopoldina, mas a Marquesa de Santos era uma personagem tão controversa e teve uma influência tão grande sobre o Primeiro Reinado que nem sei bem por que me encanta. Talvez por ter sido uma mulher muito à frente de seu tempo e que foi capaz de provocar em Pedro I, reconhecidamente um mulherengo inveterado, uma paixão tão tórrida quanto uma admiração sem limites. Não era uma beldade, devia ter alguma coisa maior do que beleza. Ou não? Seria apenas sexo?
De qualquer maneira acabei ficando com Domitila, sem o i. Menos doce, mais forte, mais sonoro, mais impactante.
Foi difícil encontrar a casa, que fica numa ruazinha secundária, quase invisível e minha ansiedade ia aumentando. Teria errado o endereço, teria ouvido mal? O número não existia naquela rua. Não era aquela rua? Ai meu Deus, que saga! Telefonei e a moça indicou uma espécie de beco em rampa e sem saída, onde carros não entravam. Depois de várias voltas consegui ver a tal ruazinha, que tinha o mesmo nome da outra e formava um T com esta.
Enfim, encontrei a casa e pude ver que a Domitila estava maior do que me lembrava há apenas 22 dias. Mas era ela mesma, toda ronronante no colo da Adriana. Eu deveria levar para vacinar e castrar etc., rações etc., tudo certinho e pronto.
Foi colocada na caixa de transporte e levada até o carro, no banco do passageiro. Tchauzinho, obrigada por tudo, até qualquer dia etc..
Já eram seis da tarde e pegamos o maior transito caótico como sempre. Domitila miava e eu falava com ela, para acostumá-la à minha voz. Coloquei os dedos nas aberturas da portinha da caixa e ela esfregava neles sua cabecinha. Se eu tirava os dedos, ela recomeçava a miar.
Começamos imediatamente a estabelecer um relacionamento intenso. Fiquei surpresa com sua carência de contato físico. De todos os gatos que conheci, nenhum demonstrava tal dependência, deixavam-se acariciar, mas não necessitavam disso.
Tive de dirigir com uma só mão na maior parte do trajeto, o que não me desagradou nem um pouco.
Chegando à nossa casa, levei Domitila ao banheiro que estava preparado para ela, o azul, com almofadas, tapetes, pratinhos com ração e água. Ela cheirou e experimentou tudo, curiosa e investigadora. Logo o
banheiro perdeu o interesse e ela foi procurar outros ambientes. Eu a acompanhava,
mostrando tudo e quanta coisa interessante ela ia encontrando pela casa! O arranhador
para afiar as unhas foi devidamente arranhado, as gavetas dos quartos farejadas
e tentativas foram feitas de adentrá-las, as camas observadas com toda atenção,
os sofás das salas e as cadeiras da copa bem escalados, e os vasos de plantas...
ah! os vasos... com terra! - que delícia
para quem viveu algum tempo primeiro pelas ruas, depois numa gaiola compartilhada
com mais oito gatos, uns mansos, outros indiferentes e outros mais agressivos, quase
sem contato humano.
E esse contato físico que ela procurava o tempo todo. E miava de um jeito que nunca ouvi antes: fazia (e faz ainda)
1) três sons A a a?
2) Au? (e não miau) interrogativo
3) mmmm...
E isso só nas primeiras horas em casa.
Brinquedo? Qualquer pedacinho de papel, qualquer lápis, canetas, uma pena do espanador, enfim, qualquer coisa que se mexa serve. E ela resolve as situações críticas sem choro nem pedidos de ajuda. Vejam este vídeo, feito dois dias depois que ela chegou.
Brinquedo? Qualquer pedacinho de papel, qualquer lápis, canetas, uma pena do espanador, enfim, qualquer coisa que se mexa serve. E ela resolve as situações críticas sem choro nem pedidos de ajuda. Vejam este vídeo, feito dois dias depois que ela chegou.
http://youtu.be/p1_q9c7aGQI