Desde que apresentei a ela o jardim ao sol e ela sentiu a grama, a terra, as plantas e o espaço todo só para ela, penso que, a lembrança dos dias na gaiola compartilhada com mais oito gatos nem sempre gentis uns com os outros, deve ter começado a se esmaecer. Porque ela, antes desconfiada de tudo, ficou muito feliz explorando cada recanto. Corria e corria, farejava cada novidade e cada pequeno detalhe era digno de todo interesse.
Arbustos de azáleas foram estudados atenciosamente, a samambaia xaxim e os pés de café (temos quatro! cujas sementes foram semeadas pelos passarinhos) foram valentemente escalados com facilidade. Só não sabia ainda como descer e pedia ajuda. Mas nos dias seguintes deixei que resolvesse sozinha mais esse problema.
Descobriu logo que os arbustos de filodendros e samambaias paulistinhas podiam ser utilizados para brincar de esconder.
Ali, no jardim, nem adiantava chamar... sempre respondia com seus miados coloridos, mas só vinha mesmo quando a fome apertava ou o sono chegava. E ela tem fome e sono o tempo todo, parece. Ainda bem senão ficaria torrando ao sol no alto do pé de café, o seu favorito.
O Primeiro Susto
Domitila não saía de perto de mim em nenhum momento quando dentro de casa. Podia estar dormindo profundamente em sua almofada ao lado do computador, ou no tapete da cozinha, no piso do banheiro, no sofá da sala de TV, na cadeira da copa. Mas bastava que me levantasse sem ruído algum para que suas orelhas detectassem imediatamente. Levantava-se como sonâmbula, os olhos semicerrados, espreguiçando-se e alongando-se, tonta de sono, mas juntando-se a mim.
Uma noite, estava em meu colo na sala de TV. Eu estava muito cansada e nem me dei conta de que havia dormido durante o programa. Quando acordei era mais de meia noite e Domitila não estava. Chamei e não veio resposta. Chamei de novo e de novo. Nada. Procurei pela casa toda sempre chamando e o silêncio era total. Fui para o jardim e continuei chamando baixinho para não perturbar a vizinhança, mas nem sinal dos delicados miados de resposta. Fui até perto do portão da garagem e chamei em surdina — Domitiiila! Pchiuí pchiuí! — Nada!
Fiquei aflita pensando que se ela tivesse sumido na noite e que eu pudesse ter perdido sua companhia constante e já tão importante em minha vida, abriria um vácuo difícil de preencher... Ó meu Deus, não! Não quero ficar sem minha belezinha! Ai... não!...
Voltei para o jardim e continuei a busca e os chamados. Flávio ouviu e veio ajudar, também inquieto. Nesse momento pensei ter ouvido algo, muito baixinho ou muito longe. Será que eu ouvira mesmo ou teria sido imaginação? Será que eu ouvira o que mais estava desejando? Voltamos para o portão e maravilha, ouvimos o miado vindo da rua. Acionamos o controle e a pequenina fujona entrou desabaladamente, sentou-se e já começou a lamber-se, seu 25º banho do dia, no mínimo.
Resolvi ali mesmo que, no dia seguinte procuraria o veterinário para registrá-la devidamente na Zoonose.
Foi o que fiz. Paguei a taxa e ela ganhou uma plaquinha identificadora com seu número e o telefone da Zoonose para o caso de se perder. Em seguida fui à Cobasi e comprei uma coleirinha cor de rosa com guizo, leve e linda, e ainda mais uma plaquinha Pink em forma de coração, mandei gravar o nome dela numa face e na outra o número de meu telefone. Pronto! Agora, se acontecesse de ela sair à rua, estaria identificada. Ufa! Alívio!
RGA Nº 0.808.654 é o número da Domitila, que chic!
(RG Animal)
A belezinha, porém, não gostou nem um pouco da coleira! Sentiu-se subjugada e revoltou-se pulando para baixo e para cima, dando saltos mortais e sacudindo a cabeça para livrar-se. Parecia um cavalo de rodeio...
Pena que não estávamos com a câmera para filmar aquilo...